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PEC do Teto é 'erro técnico absurdo' e compromete avanço da ciência brasileira, avaliam especialistas em debate no campus Pampulha

05 de Dezembro de 2016 às 09:17:18

A desmobilização da população brasileira em relação à Proposta de Emenda Constitucional que limita os gastos públicos por 20 anos – a PEC 55, antiga PEC 241 –, que tramita no Congresso Nacional, pode ser creditada ao papel da mídia comercial brasileira, afirmou a jornalista Ângela Maria Carrato Diniz, professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG. Sua exposição abriu, na manhã desta sexta-feira, 2, seminário promovido pela Apubh (Sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros e Ouro Branco), no auditório da Escola de Engenharia, campus Pampulha.


O evento PEC 55/241-2016: Retrocessos para a educação-ciência e déficit civilizatório teve início com apresentação que discutiu a atuação da mídia comercial brasileira em relação ao papel de informar a população do país acerca do que significa a proposta já aprovada pela Câmara dos Deputados e, em primeiro turno, pelo Senado.


DSC_8219.jpgÂngela Carrato [foto]considera que o cenário econômico encontrado pelo presidente Michel Temer (PMDB) se assemelha muito àquele com o qual Lula (PT) deparou quando assumiu a presidência em 2003, após sua primeira eleição, um ano antes. “A diferença é que Lula e o Partido dos Trabalhadores não optaram por medidas de choque, como é essa PEC. A opção, naquela época, foi pela construção de um Estado de bem-estar social”, avaliou.


É esse Estado de direitos que, segundo Carrato, está sendo destruído pelo atual governo com medidas como a PEC 55. “A cada medida que retira direitos garantidos por esse Estado de bem-estar social construído durante os governos de Lula e Dilma Rousseff, a mídia brasileira aplaude. Em vez de apresentar as várias facetas da realidade, a mídia escolheu uma verdade que tem expressado no dia a dia, que está diretamente associada aos interesses do capital internacional”, afirmou.


Para a professora, a postura da mídia comercial brasileira demonstra que ela é “inimiga do Estado de Direito”. “Em países da Europa e nos Estados Unidos, a mídia foi parceira do Estado na construção do Estado de bem-estar social. Aqui, ela tem atuado na direção contrária”, pontuou.


Nesse contexto, a jornalista defende que a cobertura feita sobre a PEC 55 tem um lado claro, que ignora as várias outras facetas da medida. “Esse ajuste ultraneoliberal é um dos caminhos para enfrentar a crise, não é ‘o caminho’, único, como se tem tentado mostrar. Após isolar a crise brasileira do contexto mundial, ignorando a crise econômica internacional, os órgãos da mídia brasileira têm divulgado esta PEC como a única alternativa”, denunciou.


O discurso da austeridade, por exemplo, que tem sido bastante acionado, carrega um problema, na visão da jornalista. “A austeridade que está sendo proposta com essa PEC atinge apenas os pobres e a classe média. A taxação de grandes fortunas seria um caminho para incluir as pessoas que detêm o poder econômico nesse trabalho de recuperação da economia do país”, defendeu.


Prioridade e indiferença
DSC_8229.jpgEconomista graduado pela UFMG, o professor Fernando Nogueira da Costa [foto], da Unicamp, classificou a “PEC do Teto” como um “erro técnico absurdo”. “Há quatro instrumentos de política econômica: política fiscal, política monetária, política cambial e controle de capital. A equipe econômica do atual governo simplesmente decidiu que o ajuste fiscal é prioritário, ou seja, as outras três políticas seriam indiferentes, não se alterariam”, criticou.


Para o professor, “a política fiscal deveria ser coordenada com as demais políticas que são instrumentos do sistema econômico". Fernando Costa defende que não é possível que a conjuntura do país mude e se mantenha a mesma política econômica. “A conjuntura muda, e a política econômica não vai mudar? Estamos atravessando a maior depressão da história econômica do Brasil, e não será tomada nenhuma ação para impulsionar o investimento?”, questionou.


Os problemas da PEC, no entanto, não se limitam ao caráter econômico. Para Fernando Costa, eles são ainda mais graves do ponto de vista político. “A aprovação da emenda interdita a democracia brasileira por 20 anos, pois retira o nosso direito de escolher, por meio do voto, o programa governamental a ser adotado em mandados de quatro anos. A PEC impõe o uso compulsório de uma mesma política por governos futuros”, afirmou.


O professor da Unicamp considera que, com a aprovação da PEC 55, “viveremos uma época de ditadura econômica. Tal situação vai perdurar enquanto a situação socioeconômica brasileira não piorar suficientemente de forma a gerar um consenso que mova três quintos dos votos do Congresso Nacional para revogar essa emenda constitucional absurda”, concluiu.


Ciência em risco
Outro palestrante desta manhã, o vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), professor Ildeu Moreira (UFRJ), criticou a redução dos investimentos proposta pela PEC e seus impactos na ciência e na pesquisa brasileiras. “A redução de investimentos compromete a possibilidade de se descobrir remédios, tratamentos, alternativas para doenças que afetam diretamente a vida de milhões de brasileiros”, afirmou ele, em entrevista à Rádio UFMG Educativa (104,5 FM).


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Ângela Carrato, o professor Helton Reis, do ICB, que mediou o debate, Fernando Costa, Paulo Beirão e Ildeu Moreira


“O Brasil era o maior produtor de álcool, e os Estados Unidos já estão passando à frente, pois desenvolveram uma tecnologia para utilizar a celulose como fonte de produção do álcool. Na agricultura, também vamos ficar para trás. A Monsanto vai desenvolver as sementes que nós vamos plantar”, disse à reportagem da Rádio UFMG Educativa.


 


Fonte: Ufmg