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Kroton prepara oferta de fusão com a Estácio e ações disparam

14 de Junho de 2016 às 13:40:55

Um dos maiores grupos de ensino superior do mundo, a Kroton informou ontem que estuda uma fusão com a Estácio, o que criaria uma companhia com valor de mercado de mais de R$ 22 bilhões e 1,6 milhão de alunos - o que corresponde a 23,5% do setor de ensino superior privado brasileiro. A proposta será enviada oficialmente à Estácio em até duas semanas, mas já se sabe que a companhia carioca não aceitará a oferta nas atuais condições, segundo o Valor apurou. A proposta envolve uma troca de papéis, em que 0,977 da ação ordinária da Kroton vai representar uma ação da Estácio, com base na média dos pregões do mês passado.


A investida da Kroton é justificada pelo momento em que vive o setor de educação. Com a recessão e a redução do programa de crédito estudantil do governo (Fies), as aquisições e fusões voltaram ao radar das grandes companhias como caminho para ganhar mercado, uma vez que o crescimento orgânico é restrito no atual cenário de desemprego. Além disso, o apetite da Kroton - que é forte geradora de caixa - aumentou porque as ações Estácio se desvalorizaram muito do ano passado para cá. 


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De acordo com fontes do setor, a Kroton já trabalha com a possibilidade de a Estácio exigir um prêmio para aceitar o acordo. Segundo estimativas do Bradesco BBI, esse prêmio deveria ser entre 30% e 50% sobre a cotação do dia 1º de junho. Ao que tudo indica os próximos capítulos devem ser de uma negociação acirrada com a Estácio, de um lado, argumentando que o preço oferecido está abaixo do potencial da companhia e com a Kroton batendo na tecla de que a fusão vai gerar aumento de margens e múltiplos.


Além disso, uma forte pressão deve vir de fundos de investimento que são acionistas comuns nas duas empresas. A Oppenheimer tem 5% da Kroton e ao mesmo tempo é a maior acionista individual da Estácio, com uma fatia de 17,7%. Os fundos Oppenheimer, Coronation, Capital e BlackRock juntos têm 41% da Estácio e detém 21,5% da Kroton. Diante da possibilidade de uma fusão, os papéis da Estácio e Kroton dispararam na bolsa e fecharam ontem com alta 22,74% e 12,85%, respectivamente.


Os analistas que acompanham o setor de educação foram praticamente unânimes ao destacar, em seus relatórios enviados a investidores, que a transação, se aprovada, vai gerar valor às companhias. Segundo estimativas de Roberto Otero, do Bank of America Merrill Lynch (BofA), uma fusão poderia gerar de sinergias de R$ 4 bilhões.


No entanto, todos levantaram a possibilidade de o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) impor restrições severas ao negócio, principalmente no segmento de ensino a distância, em que as duas empresas passam a ter quase 50% de participação.


Na fusão da Kroton com a Anhanguera em 2014, a autarquia determinou a venda da Uniasselvi, de ensino on-line. Mas a transação em questão pode ser mais complexa porque boa parte do ensino a distância da Estácio é integrado à companhia, ou seja, não é um negócio à parte como era a Uniasselvi, segundo Luiz Trivelato, da consultoria Educa Insights. Na Estácio, a divisão on-line que poderia ser vendida é a UniSEB, comprada em 2013 por R$ 615 milhões. Já a Kroton é dona da Unopar e Uniderp, que juntas têm mais de 500 mil alunos. "Mas vender a Uniderp, Unopar ou dividir a Estácio torna a transação inviável", diz Bruno Giardino, analista do Santander.


Apesar das possíveis restrições do Cade, as análises de especialistas do setor mostram que tais impactos não seriam tão relevantes. Segundo a consultoria Educa Insights, a nova companhia combinada precisaria se desfazer de 9% de seus alunos de cursos presenciais e a distância. Levando em conta apenas o ensino a distância, as empresas seriam obrigadas a se desfazer de 15% dos seus estudantes. No presencial, esse percentual seria de apenas 4%. O Cade considera em suas análises a concorrência em cidades em que as empresas tenham uma participação superior a 30%.


No último mês, os rumores de que poderia haver uma investida da Kroton aumentaram, mas a expectativa é que o alvo fosse a Ser Educacional, que também perdeu muito valor de mercado no ano passado. Além disso, a Estácio teria mais dificuldades de fazer uma aquisição de grande porte. Não à toa, os analistas que acompanham o setor defendiam que o melhor caminho à Estácio era usar o caixa proveniente de Fies para recompra de ações. "Nas últimas aquisições, a Estácio pagou em média R$ 8 mil por aluno, mas hoje o valor de mercado da companhia equivale a R$ 7,2 mil por aluno. Portanto, mesmo se considerarmos um grande desconto sobre o preço pago por aquisições futuras, seria difícil justificar uma aquisição como sendo mais atraente do que a recompra de ações", destacaram Luiz Fernando Azevedo e Tales Freire, analistas da Bradesco BBI, em relatório.


A Kroton dever ter uma geração de caixa de R$ 2,2 bilhões contra R$ 500 milhões da Estácio neste ano. "Esperamos que a Kroton gere um caixa de R$ 1,8 bilhão [de títulos Fies] neste ano e R$ 2,1 bilhões em 2017, o que permite à companhia considerar qualquer transação de M&A no Brasil, incluindo os dez maiores grupos de ensino superior. Contudo, acreditamos que apenas dois ou três nomes seriam aquisições capazes de gerar valor considerável para os acionistas da Kroton", informam os analistas do Bradesco. Esses grupos são Estácio, Anima e Ser. (Colaboraram Tatiane Bortolozi, de São Paulo, e Lucas Marchesini, de Brasília).


 


Fonte: Valor Econômico